Proteger a democracia brasileira exige combate assertivo à desinformação

 

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A disseminação de informações falsas e enganosas de forma rápida e em grande escala está comprometendo a democracia brasileira. Ao ganhar espaço, mais um vez, durante a campanha eleitoral, a desinformação dificulta o debate público acerca dos temas mais relevantes para o país e, principalmente, afeta de forma direta o direito de escolha livre e informada do eleitorado.

Na prática, os amplos e graves processos de desinformação em curso nestas eleições violam a liberdade de opinião e a dimensão coletiva da liberdade de expressão, reconhecida pelo Sistema ONU e pelo Sistema Interamericano de Direitos Humanos, que protege o direito de a sociedade estar bem informada.

Realizar eleições em meio a um intenso fluxo de desinformação tem imposto um enorme desafio à Justiça Eleitoral. Infelizmente, muitas das ações e medidas adotadas pelos tribunais não vinham sendo suficientemente ágeis e abrangentes para impedir, de forma efetiva, que o ambiente informacional fosse tomado pela desinformação ao longo do processo eleitoral.

Por outro lado, as políticas e ações das empresas responsáveis pelas plataformas digitais se mostraram lenientes com a dinâmica que alimenta e favorece a disseminação de informações comprovadamente inverídicas que afrontam a integridade do processo eleitoral brasileiro.

Pesquisadores que têm feito monitoramento sistemático das redes sociais identificaram forte coordenação na difusão de desinformação desde a véspera do primeiro turno. Informações falsas ou enganosas sobre o sistema eleitoral e contra candidaturas têm sido veiculadas não apenas a partir de publicações orgânicas, mas também em anúncios pagos, inclusive durante os dias em que a propaganda eleitoral é proibida. Ao mesmo tempo, há ocorrência significativa de publicações que violam as regras das plataformas e não foram moderadas ou removidas, bem como decisões judiciais não cumpridas por contas, perfis e plataformas.

Esse cenário, já preocupante, vem se agravando. A disseminação de desinformação em grande escala na reta final do segundo turno afeta a normalidade e a integridade do processo eleitoral, e pode causar danos irreparáveis ao processo eleitoral e, consequentemente, à democracia brasileira.

A resolução aprovada por unanimidade pelo Tribunal Superior Eleitoral na última quinta-feira (20), ainda que possa ser aperfeiçoada, enfrenta o problema ao estabelecer normas que permitam a concretização dos princípios constitucionais e a preservação das regras estabelecidas na legislação eleitoral. Eventuais equívocos em sua implementação podem ser corrigidos. O que o TSE não poderia é ter se mantido omisso face à atual onda deliberada de desinformação voltada a degradar o processo democrático.

A imposição de prazos mais curtos para ação das plataformas e a facilitação de remoção de conteúdos idênticos aos já julgados pelo Tribunal nada mais faz do que garantir efetividade às suas decisões. A lentidão na remoção de informações falsas e enganosas e a sua rápida difusão em outros links diferentes dos julgados vinha tornando inócuas as decisões do tribunal.

A determinação de remoção de ofício por parte do TSE limita-se aos casos de “fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral, inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos”. Tais casos não vêm sendo levados pelas candidaturas para apreciação do tribunal, por não afetarem individualmente os candidatos. Já a proibição de veiculação paga de propaganda eleitoral 48 horas antes e 24 horas após o pleito apenas confirma a equivalência da propaganda na Internet àquela veiculada em jornais.

A aplicação desses e de outros mecanismos previstos na resolução estará sob observação atenta da sociedade, que poderá apontar eventuais erros ou abusos. Entendemos que o esforço do Tribunal Superior Eleitoral vai na direção de garantir que a desinformação não afete a integridade do processo eleitoral nem impacte a efetivação do resultado da vontade dos eleitores, e deve levar sempre em conta o equilíbrio das dimensões coletiva e individual da liberdade de expressão, liberdade de opinião e acesso à informação.

Entendemos ainda que tanto o Ministério Público Eleitoral quanto as plataformas digitais deveriam fortalecer sua atuação e a busca ativa de soluções para esse problema que afeta tão gravemente a democracia brasileira.

São Paulo, 22 de outubro de 2022

Assinam:
1. ARTIGO 19 Brasil
2. Associação Brasileira de Imprensa - ABI
3. Associação Juízes para a Democracia - AJD
4. Coalizão Direitos na Rede
5. Comissão Arns
6. Conectas Direitos Humanos
7. Direitos Já! Fórum pela Democracia
8. Fórum Brasileiro de Segurança Pública
9. Fundação Tide Setubal
10.Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social
11. Nossas
12.Observatório do Clima
13.Pensamento Nacional das Bases Empresariais – PNBE
14.Projeto Saúde e Alegria
15.Rede Liberdade
16.Rede Nacional de Combate à Desinformação
17.Uneafro Brasil